segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

A vontade de felicidade

A busca pela felicidade e o bem-estar é constante em nossas vidas, algo que muitos almejam de diferentes formas. Entretanto, essa caminhada rumo a uma vida feliz pode ter alguns empecilhos, muitas vezes crônicos. Uma desilusão amorosa, um emprego perdido, uma pessoa querida que já não se encontra no mundo onde vivemos, tudo isso contribui para alguns traumas que impedem um indivíduo de se tornar feliz.
A vida consiste em apego e desapego. Muitos temem essa mística que gira em torno do apego com o pensamento de que caso alguma pessoa querida – uma esposa, um filho, um pai, irmão, etc... - faleça, nunca mais se verão. O cristianismo tem uma solução fácil para esse problema, ambos voltarão a se ver em um plano mais elevado que a própria vida, onde ambos serão puramente espirituais e que viverão felizes eternamente. Esse pensamento ilusório é uma forma na qual as pessoas acham uma maneira de se conformarem de que o que acabou pode e vai voltar no “reino dos céus”. Contudo, mesmo que o indivíduo viva uma vida antagônica à religião e a todos os aspectos religiosos, não é plausível que desfrute de sua vida de uma forma na qual não irá ter nenhuma relação inter-pessoal com nenhum outro ser humano. O apego faz parte de nossas vidas, e está presente em sentimentos como o amor e a amizade. Essas sensações podem ser ao mesmo tempo puras e falsas, a primeira hipótese que traz o sentimento puro como foco, é um dos mais lindos da natureza humana, entretanto também o mais perigoso, pois caso não haja o amor mútuo a segunda hipótese mencionada entra em questão, o sentimento falso é aquele que desencadeará os piores sentimentos, como a mágoa, solidão e raiva. Essas emoções despertam nos seres humanos os sentimentos mais primitivos – a violência – ou uma perda de credibilidade nas pessoas, ou seja, um trauma de se envolver com outrem.
Constantes perdas foi o que influenciou os maiores poetas da história, como Luís Vaz de Camões, que apesar de não basear toda a sua poesia rondando em torno da morte de sua amada, ele escreveu um soneto sublime o qual mostrarei abaixo:

“Alma minha gentil,que te partiste
Tão cedo desta vida ,descontente
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.
Se lá no assento etéreo ,onde subiste
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste
E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa sem remédio de perder-te
Roga a Deus ,que teus anos encurtou
Que tão cedo de cá me leve a ver-te
Quão cedo de meus olhos te levou.”


Este soneto explicita o pior sentimento de todos – a saudade – de uma forma harmônica e tocante. Na última estrofe é presente o dualismo platônico à respeito do “reino dos céus”, algo que iludia Camões de que algum dia veria a pureza dos olhos de sua companheira novamente. E o trauma é presente na primeira estrofe na qual ele expressa a tristeza crônica que terá durante o restante de seus dias, enquanto a sua amada estaria no céu repousando.
Essa tristeza que acabava com a vida de Camões, e o que o inspirava a compor os mais belos poemas, é algo que deve inexistir na vida de alguém. O apego é necessário para encontrar a felicidade, assim como a religião pode deixar alguém feliz de uma forma falsa e ilusória, a filosofia também o pode, todavia de uma forma coerente e consciente na qual o medo da morte será inexistente, o apego será constante e a vida, por sua vez, será feliz. Viver consistindo sua existência no desapego é uma forma egoísta para com os outros seres humanos e para consigo mesmo, isso faz com que um indivíduo de grande potencial não evolua e muito menos viva de uma forma feliz.
A busca pela felicidade deve ser consciente, para ser feliz deve-se aceitar a vida como ela é, assim como Nietzsche falava do seu “Amor Fati”(amor ao destino), como um meio de aceitar a vida como ela é, mesmo com todas as enfermidades e reviravoltas da vida. A sociedade é mascarada hoje, e o que atrai as pessoas é justamente aquilo que não existe, que é ilusório. O falso predomina sobre o verdadeiro, e a qualidade é substituída por aquilo que não existe, pelo menos da forma como é explicitada.
Quebrar essa barreira que existe entre o trauma e a vida feliz é um passo muito grande na vida de um indivíduo, que passou por várias reviravoltas amorosas e afetivas em sua vida, portanto deve ser de uma forma minuciosa. Essa desconfiança acontece justamente pela busca da felicidade por parte de outrem, para uns felicidade é ser promiscuo, para outros é viver com uma só pessoa. Afinal, o que é ser feliz? Se felicidade consiste em ficar bem e amar a sua vida e não trocá-la por nada, então a felicidade para Hitler era criar uma hegemonia da raça ariana, para Lênin o bem-estar era implantar o socialismo em todo o mundo e para os cristãos felicidade é viver esperando o dia do juízo final e amar incondicionalmente um líder (Cristo) que ninguém sabe se realmente foi o tal altruísta benevolente outrora expressado na Bíblia Sagrada. Felicidade para muitos é seguir os padrões estipulados pela sociedade, o que proporciona uma alegria ilusória, e para outra camada de pessoas a felicidade consiste em quebrar esses padrões, caso de Hitler. Ambos tipos estão distorcidos, o primeiro causa uma alegria que não será realmente verdadeira, pelo simples fato de ser estipulado por outras pessoas e não por você mesmo, e o segundo propicia as maiores atrocidades, feito por pessoas que se consideram revolucionários.
Ser feliz é viver sem se importar com essas barreiras criadas pela sociedade, entretanto de uma forma que não seja insana e lunática. É procurar sempre o que lhe deixará bem, e criar os seus próprios padrões pensando no seu bem e no de outras pessoas relacionadas a você. Lutar pelos seus ideais é necessário, não se deixar levar por esse “espírito de rebanho” presente no mundo contemporâneo também.

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